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Bolsonaro pode ser preso no caso das joias? Para criminalista goiano, a chance é real

Bolsonaro pode ser preso no caso das joias? Para criminalista goiano, a chance é real


Júnior Kamenach

Para Gilles Gomes, a situação pode se complicar para o ex-mandatário conforme o desenrolar da investigação
A operação Lucas 12:2 da Polícia Federal (PF) investiga evidências relacionadas à suposta venda de joias e bens de grande valor que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) recebeu durante compromissos oficiais.
Oito antigos colaboradores do ex-chefe de Estado estão atualmente em investigação pelas autoridades judiciais e da PF, sob suspeita de envolvimento em atividades criminosas com o ex-presidente como pano de fundo.
Frederick Wassef, Mauro Cesar Lourena Cid e Osmar Crivelatti são alvos da operação. Carla Zambelli, Anderson Torres, Mauro Cesar Barbosa Cid, Silvinei Vasques e Ailton Gonçalves Barros são outros colaboradores investigados pelas autoridades judiciais. Entre esses oito indivíduos, três estão detidos – Barros, Vasques e Mauro Cid (filho).
O Jornal Opção ouviu o advogado criminalista e especialista em Direito Penal e Criminologia, Gilles Gomes, sobre esse cenário. E, para o especialista, existe a possibilidade real de prisão de Bolsonaro.
“A cada novo desdobramento, a PF traz um novo personagem, ou pelo menos a atuação de um já conhecido. Antes se falava apenas de um colar, que já ampliou para uma estátua, depois um relógio. O fato é que, tudo que já foi arrecadado, deixa muito claro a prática de crime de peculato, que é quando um funcionário público se apropria de dinheiro ou qualquer bem móvel que tenha em sua posse em função do cargo”, afirmou.
Apesar disso, Gilles explica que, em tese, apenas por peculato e, considerando que o ato ocorreu há algum tempo, não é motivo para prisão. Ainda assim, ele aponta que a operação também pode sugerir a existência de outros dois crimes, deixando a possibilidade de detenção real.
O criminalista afirma que, à medida que a investigação vai avançando e apontando outros atores, isso começa a trazer no mínimo mais outros dois crimes. Um deles é o de lavagem de capitais, que é “quando um valor proveniente de um crime, ou bem, é reinserido na economia formal de modo a distanciar esse produto da sua origem ilícita”. “Esse é um crime permanente, enquanto o valor, o dinheiro, ou a joia está oculta, o crime está acontecendo e os elementos para prisão preventiva estão presentes”, argumentou.
Há ainda, segundo ele, um cenário que indica a existência de outro crime, que é o de organização criminosa. “Eu até teria algum cuidado, por ser criminalista, em cravar que há uma organização criminosa há duas semanas, que seria apenas uma associação em que a pena é menor, mas já se desenha ser uma organização, que tem de forma muito bem delimitada atores e funções bem designadas”, completou.
Para diferenciar, Gilles destaca que associação criminosa é quando envolve crimes em que há uma complexidade, ou especialização do grupo que comete o crime, menor, algo mais rudimentar. Trata-se do antigo crime de quadrilha ou bando. Já a organização caracteriza uma sofisticação, com mais de quatro pessoas envolvidas, uma estrutura ordenada, com divisão de tarefas, ainda que de maneira informal, em crimes que as penas máximas sejam superiores a quatro anos de prisão.
Passaporte
Deputados de oposição pediram que a operação confisque o passaporte de Bolsonaro para evitar uma possível fuga do ex-presidente em caso de um mandado de prisão ser expedido. Gilles disse que também é uma possibilidade.
“Está na mesma linha da possibilidade de prisão preventiva. A existência de elementos para prender são os mesmos para o passaporte. O que muda do remédio é a dosagem. A prisão preventiva seria uma dosagem bastante forte, para sedar o doente. A retenção do passaporte, ou uma tornozeleira eletrônica, ou uma prisão domiciliar, seriam doses mais fracas”, analisa o advogado, que disse que, para a retenção do passaporte, tem deve haver clareza e dados concretos sobre a possibilidade dele de fato deixar o País.
Bens são da União ou do presidente?
É importante ressaltar que existem presentes recebidos durante uma viagem oficial que são de fato para o presidente em exercício e outros para o Estado. No caso de joias, o criminalista explica que é patrimônio da União.
“Presentes de alto valor agregado não integram aqueles que integram o acervo pessoal do presidente. A Lei Anticorrupção fala que presentes são proibidos quando indicar algum tipo de benefício ou negócios que são travados”, aponta.
O criminalista cita a Lei 8.394/91, que dispõe sobre a preservação, organização e proteção dos acervos e documentação privada dos presidentes da República fala o que integra. “O decreto 4.344/02 regulamenta a lei e diz o que integra o acervo e o que não integra”.
Sigilo na investigação
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, emitiu uma ordem que proíbe Frederick Wassef, antigo advogado Bolsonaro, de obter acesso a evidências no âmbito da investigação relativa à suposta transação de um relógio Rolex, bem como sua subsequente recompra nos Estados Unidos.
A medida foi tomada por Moraes como parte da decisão completa, que autorizou buscas e apreensões relacionadas a Wassef em 11 de agosto de 2023, na última sexta-feira. Nessa deliberação, o ministro Moraes suspendeu certos privilégios que Wassef desfrutaria devido à sua ocupação anterior como advogado.
De acordo com as considerações de Moraes, permitir a Wassef acesso a provas nesse caso específico “prejudicaria a efetividade da investigação” em fases subsequentes. O ministro do STF também argumentou que as acusações dirigidas a Wassef não teriam “qualquer relação com o exercício da profissão de advogado”.
Em tese, de forma não específica, Gilles Gomes explica que o investigador tem uma margem de sigilo daquilo que integra a investigação, que abrange “aquilo que não é formalmente documentado nos autos de inquérito, que passa a ser quando há uma portaria”.
“O ato administrativo no qual o delegado abre oficialmente a investigação, enquanto não há a documentação nesse inquérito, abre uma margem de sigilo. Então, a pessoa interessada pode sim ter o acesso restringido a ela”, disse.
“Ele também tem que ser interessado nessa investigação, minimamente figurar ou ter anseio de ser um dos alvos para o direito de acesso se fundamente. Caso ele ache que a polícia esteja obstando que ele acesse, tem a via do habeas corpus, junto à autoridade competente para que garanta o acesso com base na Súmula regulante 14 do STF”, concluiu.

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