Repasse da União a Estados por compensação de ICMS pode esbarrar na lei eleitoral
A ideia de redução de impostos sobre combustíveis do governo, por meio do Projeto de Lei Complementar (PLP) 18/2022 – ou PL dos Combustíveis – pode esbarrar na lei eleitoral, especialmente por conta dos repasses previstos para compensação de estados e municípios. Segundo advogados especialistas em direito eleitoral ouvidos pelo Jornal Opção, há possibilidade da transferência ser entendida como repasse ilegal, caracterizando favorecimento a um candidato durante a disputa, no caso do atual presidente Jair Bolsonaro (PL).
O pacote proposto pelo governo fixa teto de 17% do ICMS sobre combustíveis, energia elétrica, transporte e telecomunicações, e uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para autorizar os Estados a zerarem o ICMS sobre o diesel e o gás de cozinha até o fim do ano. A redução seria compensada pela União aos Estados, por meio de repasse de R$ 29,6 bilhões, pago em cinco parcelas.
A lei nº 9.504/1997, também chamada de Lei das Eleições, veda transferências voluntárias nos três meses que antecedem o pleito eleitoral de recursos da União aos estados e municípios, e dos estados aos municípios, sob pena de nulidade de pleno direito. Além disso, o parágrafo 10 do texto também proíbe “distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da administração pública”. Em ambos os casos, há exceções para repasse de recursos por obrigações preexistentes ou cenários de calamidade pública e estado de emergência.
Segundo o advogado Bruno Pena, tanto o repasse bilionário aos estados como a oferta do benefício de redução de preços de combustíveis poderiam ser interpretados como ilegais, a depender da discussão. “A lei traz isso porque é algo que poderia ter sido feito no ano anterior. Não se faz porque envolve gastos. É mais barato e traz mais contrapartidas fazer em ano eleitoral”, aponta.
Além disso, ele pontua que o governo pode basear a defesa no trecho da lei que menciona cenários de estado de emergência. “A pandemia ainda não acabou, então o Poder Judiciário pode entender como aceitável isso ser realizado em ano eleitoral”, aponta. “É um caso que cabe apreciação pela Justiça Eleitoral.”
Já o advogado Danilo de Freitas aponta que há dois cenários importantes para se observar para determinar os dois possíveis caminhos da interpretação da medida. Por um lado, ele entende que o governo pode alegar legalidade dos repasses, caso ela fique explícita na lei. Além disso o especialista lembra que o projeto é de autoria do deputado federal Danilo Forte (PSDB-CE) e, assim, saiu do parlamento, não sendo é um ato voluntário direto do presidente Jair Bolsonaro (PL), o que também pode proteger o governo.
Ainda assim, ele reconhece que é preciso observar como o pacote de benefícios será utilizado ao longo da campanha. “Caso use na campanha, aí poderia ser entendido como uma forma de beneficiá-lo, porque demonstra que ele está usando [a medida como vantagem na disputa]”, explica. “Mas vindo do Congresso, ele estaria mentindo, porque não foi exatamente ele que concedeu.”
Risco nos estados
Danilo também pontua que há um risco da legislação eleitoral barrar governadores em campanha. Uma vez que a mudança fixa um teto de 17%, os estados poderiam reduzir o imposto abaixo do patamar, como forma de acumular benefícios como moeda de troca no palanque eleitoral, mas é preciso analisar caso a caso, se isso vier a ocorrer. “A forma com que cada Estado poderá reduzir ainda mais pode descambar pra uma concessão indevida, aí sim o ato passaria a ser um problema para o chefe do executivo local, o governador”.